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(Des)territorializando as Pulsões em Lacan: Por uma cartografia de sentidos

A cartografia de sentidos é um conceito que explora a representação e mapeamento das experiências subjetivas, indo além das coordenadas geográficas. Envolve a criação de mapas emocionais, culturais e sensoriais que refletem a complexidade das vivências humanas. Essa abordagem transcende as fronteiras físicas, buscando entender as nuances e significados subjacentes aos espaços, relacionando-se com a pulsão epistemofílica ao explorar os territórios do significado e da compreensão. Com base nos referenciais teóricos de Lacan, através deste artigo será feito aquela exposição retórico-argumentativo sobre as categorias de pulsão, ao seguir uma disciplina de desterritorialização das categorias pulsionais psicanalíticos ao dividí-los em eixos do modelo teórico da segunda tópica em Freud.

1. Eixo ID

A sigla "ID" remete ao "Inconsciente" na psicanálise de Freud, sendo o reservatório de desejos instintivos. Como eixo temático, o ID representa a exploração das camadas mais profundas da psique, desvendando motivações intrínsecas, conflitos e impulsos primordiais. Ao abordar o ID como tema, a narrativa mergulha nas complexidades da mente humana, explorando o terreno fértil dos instintos e emoções subjacentes, enriquecendo a compreensão da natureza humana.

1.1. Pulsão Escópica

Pulsão Escópica é um conceito fundamental na teoria lacaniana, descreve a poderosa força pulsional ligada ao olhar. Ela representa o impulso inato e primal de buscar e capturar objetos visuais, buscando prazer e satisfação. A Pulsão Escópica transcende a mera visão física, envolvendo aspectos psíquicos e simbólicos.

Essa pulsão está ligada à formação do eu e da identidade, pois através do olhar, o indivíduo se reconhece e é reconhecido pelos outros. No entanto, a Pulsão Escópica também carrega uma dimensão de desejo, pois implica na busca por aquilo que não pode ser completamente satisfeito, gerando uma falta e um anseio contínuo.

Ao mesmo tempo que é uma fonte de prazer e conhecimento, a Pulsão Escópica pode gerar angústia e conflito, uma vez que o olhar do outro pode ser experimentado como invasivo e ameaçador. Lacan argumenta que o sujeito está constantemente preso em um jogo de olhares, moldado pelas estruturas sociais e pelas dinâmicas de poder.

Assim, a Pulsão Escópica é um conceito complexo que encapsula a busca pelo olhar, a formação do eu e a relação com o outro, revelando as tensões entre prazer, desejo e identidade que permeiam a experiência humana.

1.2. Pulsão de Autoconservação

A Pulsão de Autoconservação, segundo Lacan, é uma força pulsional ligada à sobrevivência e preservação do organismo. Refere-se aos instintos básicos de proteção e autopreservação, como a busca por alimento, abrigo e segurança. Essa pulsão envolve o impulso inato de manter a integridade física e a saúde do indivíduo. A Pulsão de Autoconservação está intimamente relacionada ao corpo e às necessidades biológicas, representando a base instintiva do ser humano. Lacan enfatiza que, embora essencial, essa pulsão também é atravessada pelo simbólico e pelo desejo, pois a busca pela sobrevivência ocorre dentro de um contexto social e cultural, influenciando a formação do sujeito e suas relações com os outros.

2. Eixo Oral

O termo "ORAL" na psicanálise destaca a fase inicial do desenvolvimento infantil, onde a boca é central. Como eixo temático, representa a exploração simbólica da alimentação, afeto e dependência. Abordar o tema "ORAL" permite investigar relações, prazeres e traumas associados à satisfação oral, oferecendo uma lente para compreender complexidades emocionais e padrões comportamentais, enriquecendo a narrativa ao explorar as raízes da psique humana.

2.1. Pulsão Invocante

A Pulsão Invocante, em Lacan, refere-se à força pulsional ligada à dimensão do discurso e da linguagem. É a busca por reconhecimento e validação através da invocação do outro. A pulsão invocante envolve o desejo de ser nomeado, ouvido e respondido pelo outro, buscando a confirmação de sua existência e identidade. Essa busca incessante pelo chamado do outro pode gerar ansiedade e conflitos, uma vez que o sujeito está sempre dependente da resposta do outro para se constituir. A pulsão invocante revela a centralidade da linguagem na formação do sujeito e na busca por um lugar na sociedade.  

2.2. Pulsão Oral-Alimentar

A Pulsão Alimentar/Oral em Lacan é uma força pulsional ligada à fase oral do desenvolvimento humano. Ela representa o impulso primitivo de satisfazer as necessidades orais, como a fome, através da busca por objetos de prazer na boca. Essa pulsão está relacionada ao prazer de mamar e ao desejo de incorporar e assimilar o objeto. A Pulsão Alimentar/Oral também possui uma dimensão simbólica, representando a busca por satisfação e completude emocional. No entanto, ela também pode se manifestar como uma busca insaciável e uma fonte de dependência e ansiedade. Lacan destaca que a Pulsão Alimentar/Oral está relacionada ao desejo e à formação do sujeito, sendo um aspecto fundamental na constituição psíquica e na relação com o outro. 

3. Eixo Libidinoso

"LIBIDINAL" refere-se à energia psíquica ligada aos desejos sexuais na psicanálise. Como eixo temático, explora-se a pulsão vital da libido, permeando narrativas com paixões, amores e conflitos eróticos. Abordar o tema "LIBIDINAL" aprofunda a compreensão das dinâmicas emocionais, relacionamentos e busca pela satisfação, proporcionando uma exploração rica das profundezas da psique humana.

3.1. Pulsão Epistemofílica

Epistemofilia é uma combinação entre as palavras "episteme", que é um termo grego que se refere ao conhecimento ou compreensão, e "filia", que significa amor ou afinidade. Portanto, "epistemofilia" poderia ser interpretado como uma atração ou impulso em direção ao conhecimento ou à busca do conhecimento. É importante ter em mente que essa interpretação é uma especulação baseado na estrutura das palavras. O termo "epistemofilia" foi cunhado pelo filósofo e cientista social britânico Robert K. Merton. Ele usou o termo para descrever o amor ou desejo pelo conhecimento, a busca ativa de informações e a curiosidade intelectual. Entretanto, em psicanálise, pode ser um termo combinado com o conceito de pulsão, alcunhado por Freud em Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade (1905), para referir-se à impulsos ou instintos básicos que impulsionam o comportamento humano. Considerando essas interpretações, indutivamente a "pulsão epistemofílica" pode ser auspiciada como uma expressão que descreve um impulso ou instinto de busca ou desejo de conhecimento partindo de um princípio de atração pessoal.

4. Eixo Anal-Fálico

O termo "Anal-Fálico" na psicanálise vincula-se ao desenvolvimento infantil, abordando as fases anal e fálica. Como eixo temático, explora-se a formação da identidade, relações de poder e sexualidade. Ao integrar o "Anal-Fálico," a narrativa ganha camadas psicológicas, mergulhando nas complexidades da formação psíquica, oferecendo uma lente analítica para compreender os aspectos fundamentais da personalidade e relações interpessoais.

4.1. Pulsão Anal-Retentora

A Pulsão de Anal-retentora, segundo Lacan, é uma força pulsional relacionada à fase anal do desenvolvimento humano. Refere-se ao impulso de controle e retenção de excreções, como forma de lidar com a ansiedade e exercer poder. Essa pulsão envolve a busca por prazer e satisfação através do domínio do próprio corpo e da manipulação dos objetos. A Pulsão de retenção anal também possui uma dimensão simbólica, representando a relação do sujeito com o poder e a ordem social. No entanto, essa pulsão pode resultar em conflitos e negociações com o ambiente externo. Lacan destaca que a pulsão de retenção anal está relacionada ao desejo e à formação do sujeito, influenciando a sua relação com as normas e os limites impostos pela sociedade.

4.2. Pulsão Anal-secretório

A Pulsão Anal-secretório, segundo Lacan, é uma força pulsional relacionada à fase anal do desenvolvimento humano. Refere-se ao impulso de liberar e expelir as excreções do corpo, buscando prazer e alívio. Essa pulsão envolve a busca pela sensação de alívio e controle através da ação de eliminar. A Pulsão de Anal-secretório também possui uma dimensão simbólica, representando a relação do sujeito com o poder e o controle sobre o próprio corpo. No entanto, essa pulsão pode resultar em conflitos e negociações com o ambiente externo. Lacan destaca que a Pulsão de Anal-secretório está relacionada ao desejo e à formação do sujeito, influenciando a sua relação com as normas e os limites impostos pela sociedade.

4.3. Pulsão Anal-erótica

A Pulsão Anal-erótica, em Lacan, é uma força pulsional relacionada à fase anal do desenvolvimento humano. Refere-se ao impulso sexual ligado às sensações e prazeres associados à região anal. Essa pulsão envolve a busca de prazer através da estimulação e exploração erótica dessa área do corpo. A Pulsão de Anal-erótica também possui uma dimensão simbólica, representando a relação do sujeito com a sexualidade e a expressão de desejos eróticos. No entanto, essa pulsão pode gerar conflitos entre o desejo de gratificação e a conformidade com as normas sociais. Lacan destaca que a Pulsão de Anal-erótica está relacionada à formação do sujeito e influencia a sua relação com o prazer, o corpo e o outro, dentro do contexto da sexualidade humana. 

4.4. Pulsão Anal-sádico

A Pulsão de Anal-sádico, em Freud, é uma força pulsional relacionada à fase anal do desenvolvimento infantil. Refere-se ao prazer obtido através da manipulação e controle dos conteúdos fecais, incluindo a retenção e a expulsão. Essa pulsão envolve a gratificação associada à sensação de poder e dominação. A Pulsão de Anal-sádico também pode manifestar-se através de comportamentos agressivos e destrutivos, proporcionando um prazer derivado da causa sofrida por outras pessoas. Freud argumenta que, durante a fase anal, a criança experimenta conflitos entre o desejo de retenção e o desejo de expulsão, e esses conflitos podem moldar a personalidade adulta. A pulsão de Anal-sádico é considerada uma das pulsões básicas, juntamente com a pulsão oral, a pulsão anal-erótica e a pulsão genital.  Para Lacan, o foco não está nas pulsões específicas, como a pulsão de Anal-sádico, mas sim na estruturação do sujeito por meio da linguagem e do simbólico. Lacan enfatiza a importância do complexo de Édipo na formação do sujeito e a entrada no mundo simbólico através da linguagem. Para ele, a constituição do sujeito envolve a entrada na ordem simbólica, onde os desejos e identidades são mediados por significações culturais e linguísticas. Portanto, a perspectiva de Lacan sobre a fase anal se concentra na dimensão simbólica e na estruturação do sujeito, em vez de se ater às pulsões específicas como Freud fazia.

4.5. Pulsão Anal-masoquista

A Pulsão de Anal-masoquista, segundo Freud, refere-se a um dos aspectos da sexualidade infantil relacionada à fase anal do desenvolvimento. Ela envolve a obtenção de prazer erótico através de experiências de dor, humilhação ou submissão. O indivíduo busca gratificação sexual masoquista ao ser submetido a situações que envolvem castigo, dominação ou controle por parte de um parceiro ou figura de autoridade. Freud postula que a Pulsão de Anal-masoquista surge do conflito entre o desejo de retenção e expulsão das fezes, associado à necessidade de controle e poder. É uma forma de canalizar os instintos agressivos e destrutivos de forma sexualizada. O masoquismo é considerado uma das formas de expressão das pulsões sexuais e pode desempenhar um papel importante na constituição da sexualidade adulta.  Lacan, em sua ontologia psicolinguística, aborda a dimensão do masoquismo como uma das formas pelas quais o sujeito pode se relacionar com o gozo. Para Lacan, o masoquismo está ligado à relação entre o sujeito e o objeto a, que é um objeto de desejo perdido e inacessível. O masoquismo pode manifestar-se como uma forma de busca pelo gozo através da submissão, autohumilhação ou entrega a uma figura de autoridade. Para Lacan, o masoquismo é complexo e pode estar relacionado à questões de identificação, culpa e desejo de punição. Ele é parte do jogo das pulsões e das dinâmicas psíquicas, mas não é categorizado como uma pulsão específica, como ocorre em Freud. 

4.6. Pulsão Anal-Sadomasoquista

Dentro da teoria freudiana, é possível compreender que as pulsões anal e sádica-masoquista podem se entrelaçar. A Pulsão de Anal-sadomasoquista refere-se à obtenção de prazer erótico através de elementos tanto sádicos quanto masoquistas, relacionados à fase anal do desenvolvimento. Envolve o prazer derivado do controle e domínio sobre o outro (sadismo) e também do sofrimento ou submissão (masoquismo). Essas pulsões podem ser expressas por meio de fantasias, jogos de poder e práticas sexuais consensuais entre adultos. Freud destacou que o sadismo e o masoquismo são manifestações comuns na sexualidade humana, representando complexas combinações de pulsões e desejos, muitas vezes enraizados em experiências e conflitos infantis. Lacan aborda a temática do sadomasoquismo de uma perspectiva diferente da de Freud. Para Lacan, o foco não está nas pulsões específicas, como a Pulsão de Anal-sadomasoquista, mas sim na relação do sujeito com o gozo e com o desejo. Ele enfatiza que o masoquismo e o sadismo são expressões complexas do sujeito em relação ao Outro e ao campo simbólico. Lacan argumenta que o masoquismo pode ser uma forma de busca pelo gozo, enquanto o sadismo envolve a imposição de gozo no outro. Essas dinâmicas estão ligadas à estruturação do sujeito pela linguagem e pelo desejo, envolvendo questões de identificação, culpa e formas de lidar com a falta. Lacan busca compreender essas expressões a partir da relação do sujeito com o Outro e com o simbólico, dentro de sua teoria psicanalítica.


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