Nesta coluna, é investigada a expressão "ad benevolentiam captandam" em sua significação de "capturar a boa vontade". Descreve como essa estratégia retórica visa conquistar a simpatia do público por meio de gentileza e empatia, facilitando a aceitação de ideias e promovendo uma troca de favores mutuamente aderida. Destaca a eficácia em criar conexões emocionais positivas, mas alerta para os riscos de manipulação e superficialidade, recomendando um discernimento crítico do contexto de comunicação e uma constante busca por formação crítica.
Considerações Introdutórias
No campo da retórica e dos debates, a eficácia dos argumentos muitas vezes não se limita apenas à lógica e à evidência apresentada, mas também à capacidade de cativar a boa vontade do público ou do adversário. A expressão latina "ad benevolentiam captandam" encapsula essa ideia com elegância e profundidade. Ad benevolentiam captandam significa, literalmente, "para capturar a boa vontade" ou "para obter favor". Essa expressão descreve uma abordagem persuasiva que se baseia em conquistar a simpatia e a disposição favorável das pessoas, criando uma atmosfera de confiança e respeito mútuo.
Estrutura e Significado
Ad:
Preposição que significa "para" ou "com o objetivo
de".
Benevolentiam: Derivado de "benevolentia",
que pode ser traduzido como "boa vontade", "benevolência"
ou "favor".
Captandam: Forma do gerúndio do verbo
"captare", que implica a ideia de capturar, obter ou
conquistar.
Portanto, "ad benevolentiam captandam"
descreve a ação de buscar conquistar a boa vontade ou o favor de
alguém através de meios respeitosos e gentis.
No contexto da retórica, as relações públicas utilizam a estratégia ad benevolentiam captandam não apenas para apresentar argumentos de forma clara e convincente, mas também para estabelecer uma conexão emocional positiva com a audiência ou adversário, buscando obter sua boa vontade. No entanto, essa abordagem pode ser viesada de forma manipulativa.
A criação de uma conexão emocional pode ser superficial, visando apenas manipular as emoções do público sem um compromisso genuíno com suas preocupações. Ao focar excessivamente na criação de uma boa impressão emocional, corre-se o risco de desviar a atenção da substância dos argumentos, tornando mais fácil para o retórico desqualificar os pontos essenciais.
Podemos visualizar tal viés no comportamento eleitoral do ex-Presidente da República Jair Messias Bolsonaro. Durante a campanha presidencial, o candidato habilmente utilizou a estratégia ad benevolentiam captandam para conquistar o apoio do eleitorado. Criticou fervorosamente o líder da bancada de centro em debates e entrevistas, ganhando credibilidade pública. No entanto, após eleito, surgiram revelações perturbadoras: rumos sobre a ampliação de seu patrimônio pessoal. Para desviar a atenção, o presidente lançou uma cortina de fumaça, reavivando antigos conflitos e incitando um comportamento de torcida organizada entre seus apoiadores, em torno de seus instintos primitivos com o adjetivo “imbroxável”. A conexão emocional superficial criada durante a campanha foi usada manipulativamente para obscurecer a verdade e desviar o foco dos assuntos críticos, como a criação de um orçamento secreto.
A busca pela boa vontade pode ser explorada para introduzir argumentos questionáveis ou informações enganosas, aproveitando a confiança conquistada para invalidar o julgamento crítico da audiência. Ao concentrar-se em ganhar a simpatia de um público específico, pode-se negligenciar a diversidade de opiniões e perspectivas, alienando partes da audiência que não se sentem conectadas emocionalmente.
Podemos observar a exploração da boa vontade dos eleitores no contexto de polarização política. Por exemplo, um candidato mais à direita sugere que, se for derrotado nas próximas eleições, abrirá caminho para que as instituições governamentais e órgãos internacionais implantem o comunismo no país; enquanto o candidato mais à esquerda sugere que, se perder as eleições, o país será tomado por um eventual novo regime militar que censurará a sociedade civil em seus mais diversos ensejos, ofuscando qualquer perigo de novas candidaturas serem alavancadas por futuras mobilizações populares ou militâncias. Desse modo, com esses candidatos acirrando as eleições e aumentando suas popularidades através do pânico coletivo, ambos se alavancam como candidatos principais e, para afugentar e desacreditar quaisquer esperanças de mobilização popular em favor de uma alternativa realista, unem-se para polarizar o eleitorado ao extremo através da radicalização do discurso.
Portanto, embora a estratégia ad benevolentiam captandam possa parecer eficaz para influenciar a percepção pública, é crucial estar ciente dos riscos de manipulação emocional e da necessidade de uma análise crítica dos argumentos apresentados, para evitar ser sistematicamente invalidado por artifícios retóricos, seja no contexto pessoal ou de relações públicas.
A Eficácia da Boa Vontade
A busca pela boa vontade, descrita por ad benevolentiam captandam, é uma estratégia poderosa na persuasão. Quando um retórico é capaz de ganhar a simpatia e a confiança do público, ele cria um ambiente mais receptivo para seus argumentos. Essa abordagem vai além da simples apresentação de fatos, pois se baseia na construção de relações e na criação de um espaço onde as pessoas se sintam respeitadas e valorizadas. Esse método é particularmente eficaz em contextos onde a polarização e a desconfiança são altas. Ao demonstrar boa vontade e empatia, o orador pode desarmar resistências e abrir portas para um diálogo mais construtivo e harmonioso.
Considerações FinaisA expressão "ad benevolentiam captandam" nos lembra da importância de conquistar a boa vontade e o favor das pessoas em qualquer processo de comunicação persuasiva. Em um mundo cada vez mais fragmentado, a capacidade de inspirar benevolência e criar conexões positivas é uma habilidade que pode transformar debates e negociações em oportunidades de entendimento e colaboração. Entretanto, todo o cuidado é pouco quando o contexto do debate flerta com relações públicas, pois todos enfrentam riscos de manipulação e superficialidade no discurso. Recomendamos contínuo discernimento crítico sobre o contexto de comunicação (relações públicas, privacidade e uso pessoal de acesso à bens e serviços, afins.) e uma constante busca por formação crítica sobre o estado de bem-estar social e democratização do acesso à serviços públicos e bens de consumo.
Referências Bibliográficas
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Políticos ironizam Bolsonaro por falas contra o Centrão em 2018: ‘O que
há de pior’. Nas redes, falas do presidente contra o grupo de partidos
sem coloração ideológica foram lembradas. Poder360. Disponível em: <https://www.poder360.com.br/brasil/politicos-ironizam-bolsonaro-por-falas-contra-o-centrao-em-2018-o-que-ha-de-pior/>. Acessado em: 19 de Junho de 2024 às 12:57
Poder360. Bolsonaro puxa coro de "imbrochável" para si mesmo. Youtube, 7 de setembro de 2022. <https://www.youtube.com/watch?v=QQCpHB7t15w>. Acessado em: 19 de Junho de 2024 às 13:04
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